A Justiça Federal concedeu uma liminar requerida pelo Ministério Público Federal (MPF) e Ministério Público do Estado (MP/RN) e determinou a intervenção na Fundação Hospitalar Dr. Carlindo Dantas, que mantém o Hospital do Seridó, em Caicó. A intervenção tem prazo de 120 dias, prorrogáveis por igual período.
A decisão judicial se baseia nas “falhas graves no atendimento à população, tais como má administração no serviço hospitalar, péssimas condições estruturais e sanitárias, além de problemas na gestão da equipe de recursos humanos, quadro este que teria contribuído para recorrentes mortes de gestantes e neonatos (bebês recém-nascidos) na região seridoense”.
A junta interventora contará com três integrantes, sendo dois servidores da Prefeitura de Caicó (sendo pelo menos um da área da saúde) e um representante do Governo do Estado (servidor da 4ª Unidade Regional de Saúde Pública - 4ª Ursap). A fundação poderá participar de todas as reuniões, mas seu representante não terá direito a voto.
O prazo inicial de 120 dias para a intervenção contará a partir da reunião de instalação da junta, que deverá ocorrer em até cinco dias após a indicação dos membros. Governo do Estado e Prefeitura terão igualmente cinco dias para apresentar seus representantes.
A liminar concedida pela Justiça Federal é fruto da Ação Civil Pública 0800164-42.2015.4.05.8402 assinada pelo procurador da República Bruno Lamenha e pelos promotores de Justiça José Alves Neto e Iara Pinheiro. Tramitam no Ministério Público Estadual, em Caicó, cinco inquéritos civis que apuram uma série de irregularidades que levaram à morte de três parturientes e dois bebês, na unidade. Várias outras denúncias também já foram feitas à Procuradoria da República e à Promotoria de Justiça em Caicó.
Problemas - O Hospital do Seridó é o único estabelecimento de Caicó a prestar assistência materno-infantil, sendo o destino de pacientes de vários municípios da região. A instituição recebe recursos financeiros, profissionais e equipamentos dos governos federal, estadual e municipal. A unidade mantém 24 leitos, dos quais 17 destinados ao Sistema Único de Saúde (SUS) e sete ao atendimento privado.
A liminar reforça que os fatos apontados pelo MPF e MP/RN revelam que “a assistência materno-infantil no âmbito da região de Caicó/RN se encontra inserida em um cenário que beira ao caos”, incluindo sérios problemas na escala de plantão, principalmente da enfermagem, cuja equipe é insuficiente para atender urgência, clínica médica e cirúrgica, sala de parto e centro cirúrgico.
Além da deficiência de recursos humanos, a Funpec/UFRN identificou problemas estruturais, incluindo o fato de os equipamentos do centro cirúrgico serem obsoletos e estarem em condições precárias de uso. Uma inspeção judicial acrescentou que não existe sequer equipamento de ultrassom. Os próprios pacientes têm de custear o exame em clínicas particulares.
A unidade não dispõe de ambulância e o transporte das gestantes é realizado por veículos particulares ou através de ambulâncias da Prefeitura. As lacunas na escala dos médicos também são recorrentes. “(...) os problemas relacionados à equipe de recursos humanos e às deficiências estruturais da unidade revelam a total inaptidão da fundação em prestar um serviço de atenção obstétrica que atenda a padrões mínimos de qualidade (...)”, resume a juíza federal Sophia Nóbrega.
Para a Justiça, a intervenção é uma chance de se incrementar a “debilitada assistência materno-infantil da região de Caicó, evitando novos falecimentos de gestantes e neonatos”.
Omissão - Os problemas da unidade se somam à omissão do Município de Caicó, que não adotou providências para a retomada do serviço de assistência materno-infantil, executado pela fundação. Constatou-se que a Prefeitura não dispõe de qualquer serviço de urgência ou emergência nas áreas de obstetrícia e pediatria.
“(...) no Município de Caicó, (…) a atenção obstétrica, o parto e o pós-parto imediato têm como principal e único centro de referência um hospital mantido por fundação estatutariamente privada, assumindo o Hospital do Seridó, indevidamente, o papel de protagonista no âmbito da assistência materno-infantil na região”, lamenta a juíza federal.
Para a magistrada, o Município deveria estruturar uma assistência materno-infantil efetivamente inserida em sua rede municipal, seja mediante a prestação direta do serviço, ou por meio de descentralização administrativa.
Ações - Caberá à junta interventora tomar providências para a reestruturação e readequação do atendimento na unidade, assegurando a adequada aplicação dos recursos públicos canalizados para o serviço obstétrico. Os interventores também deverão proceder um levantamento da situação administrativa, financeira e patrimonial da entidade.
Os governos municipal e estadual terão de assegurar recursos financeiros para a manutenção do serviço, bem como recursos extras para fazer frente às benfeitorias necessárias na estrutura física, pagamento da equipe de recursos humanos, abastecimento adequado de medicamentos e insumos e aquisição de materiais e equipamentos.